Madrid em tempo de ARCOmadrid 2013

Por Adelaide Duarte, 22 fevereiro de 2013.

Na sua 32.ª edição, ainda vale a pena visitar a ARCOmadrid? A Feria Internacional de Arte Contemporáneo, ARCOmadrid 2013, teve lugar na capital espanhola entre 13 a 17 de fevereiro. Dirigida por Carlos Urroz, nesta edição a Turquia foi o país convidado, com dez galerias provenientes de Istambul a representá-lo. A sua escolha foi realizada pelo comissário Vasif Kortun, diretor de investigação e programas da SALT Istambul, e pela comissária adjunta Lara Fresko.
Este ano expuseram 201 galerias, provenientes de 27 países. Tem-se verificado uma redução do número de galerias (em 2008 estiveram presentes 295 galerias) e a área dos stands expositivos também diminuiu. A sua maioria é estrangeira, em número de 133, valores que dão continuidade à estratégia de mostrar uma forte presença internacional. Apesar destas alterações, deseja-se, porém, uma maior profissionalização da feira. No entanto, o percurso pela feira realizou-se sem grandes surpresas, com a predominante exibição de peças de autores já consagrados pela crítica, como sejam, Jaume Plensa, Cristina Iglesias, Ignasi Aballí, Pilar Albarracín, Francis Bacon, Albert Oehlen, Candida Höfer, Marina Abramović, Olafur Eliasson, Zaha Hadid, Ai Weiwei, Paula Rego, Julião Sarmento ou Helena Almeida.
A representação portuguesa não sofreu mudanças significativas face aos anos precedentes, e estiveram onze galerias presentes: a 3+1 Contemporary Art, a Baginsky Galeria/Projetos, a Carlos Carvalho – Arte Contemporânea, a Filomena Soares, a Caroline Pagés Gallery, a Pedro Cera, a Vera Cortês, sitas em Lisboa; a Quadrado Azul e a Nuno Centeno, do Porto; a Galeria Mário Sequeira, de Braga; e dos Açores, da Ponta Delgada, a Galeria Fonseca Macedo. Entre os artistas que as galerias destacaram conta-se: Daniel Blaufuks, Jesus Alberto Benitez, Pedro Barateiro, Catarina Botelho, Julien Opie, Carla Filipe, Matt Keegan, Mika Tajima, Daniel Gustav Cramer.
Uma das novidades apresentadas no programa desta edição foi implementar o projeto ARCO Collect Online, uma plataforma que permite realizar aquisições de obras online a galerias participantes na feira, por valores mais acessíveis, inferiores a 5.000€ (http://www.paddle8.com/artfairs/arco). Com a curadoria de Tania Pardo na seleção das peças, o objetivo foi o de estimular as vendas por esta via, abrindo-se a um público mais vasto do mercado da arte. Outra iniciativa foi continuar o projeto First Collector, iniciado na edição anterior, que tem por objetivo reservar um espaço na feira para prestar assessoria àqueles que desejam iniciar-se no mundo do colecionismo.
Como em anos anteriores, foi programado um conjunto de atividades no Foro e nos Encontros da ARCOmadrid. Tratam-se de iniciativas recorrentes nestes espaços mercantis que juntam profissionais – galeristas, críticos, comissários, artistas, representantes de museus e de instituições de arte, colecionadores – interessados em debater matérias sobre a produção artística contemporânea, a circulação das obras, o mercado da arte, o comissariado, entre outras, potenciando a sua aquisição neste ambiente, e premiando o colecionismo.
Destaca-se o II Encontro de Museus da Europa e da Iberoamérica, edição coorganizada por João Fernandes, agora no papel de subdiretor de Conservação, Investigação e Divulgação, do Museu Nacional Centro de Arte Reina Sofia (MNCARS). Nele, estiveram em debate quatro temas que preocupam os profissionais de museus de arte contemporânea: o conhecimento e a investigação; o património, o arquivo e a memória; o financiamento e a gestão de recursos; a dimensão educativa e social do museu. Estes temas proporcionaram uma reflexão em torno a questões como o papel do museu no sistema contemporâneo do conhecimento; o museu como memória coletiva do presente; o museu como entidade que reflete a tensão entre o local e o internacional; o lugar da obra de arte e do artista; os modelos de gestão e de financiamento num mundo liberal; e, ainda, o conceito educativo que se deseja potenciar no museu. Este encontro foi assumido como uma plataforma de ideias, um local de partilha da diversidade de experiências, de apresentação de problemas que os profissionais deste domínio se confrontam no quotidiano.
Foi também dada a palavra a colecionadores no Foro Coleccionismo, para testemunharem o contexto da formação das suas coleções, partilharem as suas experiências, as estratégias adotadas, o gosto e a sua construção, e estimular a audiência à sua mimese.
Em simultâneo com a ARCO, mas no espaço do Hotel Silken Puerta América, esteve patente a JUSTMAD, uma feira de arte destinada à promoção da arte emergente. Dirigida por Enrique Polanco, da empresa Art Fairs, conta já com a sua quarta edição. Neste espaço, mais pequeno e, nessa medida, mais propício ao diálogo com artistas, foi possível ouvir Guillaume Krick (canadiano a residir em Nantes, França), artista plástico e escultor, a discorrer com entusiasmo sobre as inquietações que o motivam a construir o seu trabalho como, por exemplo, o projeto Erosions, paysages de banlieue d’Amérique du Nord (2008-2009).
Em complemento a este comércio de arte, na cidade observa-se uma programação dinâmica, com links a artistas que participam na feira, em museus, centros de arte, galerias e outros espaços expositivos. Por exemplo, no Matadero Madrid, centro de criação contemporânea, estão patentes várias exposições relacionadas com o enfoque da feira: uma mostra apresenta o resultado do trabalho de artistas da Turquia sobre a ideia de exposição, mediação e do open studio, intitulada Aquí juntos ahora, construyendo comunidades artísticas en un mundo cambiante; a exposição Candela, da autoria do coletivo artístico cubano Los Carpinteros, instalada de modo cenográfico na antiga câmara frigorífica do matadouro como uma grande escultura; e a Arqueológica, uma exibição coletiva que pretende propor interpretações sobre conceitos como história, memória ou tempo, e questionar a metáfora das ruínas do presente. Nela participam artistas também representados na ARCO, como o português Pedro Barateiro, com a peça The negative reader (2012-2013).
Por sua vez, da programação do MNCARS, sublinham-se duas exposições temporárias: La invención concreta, Colleción Patricia Phelps de Cisneros, uma das maiores colecionadoras da contemporaneidade da Venezuela, e a exposição antológica de Cristina Iglesias, Metonimia, uma artista de San Sebastian a quem foi atribuído o prémio da melhor obra apresentada por um artista espanhol concedido pela Asociación Española de Críticos de Arte na ARCOmadrid.
Esta paralela exposição do trabalho de alguns artistas em espaços culturais na cidade atribui, com certeza, confiança a potenciais compradores, pelo pressuposto consenso e ideia de consagração do trabalho artístico dos seus autores.
Ainda vale a pena visitar a ARCOmadrid porque apesar de menos desafiante, como sempre se ambiciona, a programação que envolve o certame potencia reflexões interessantes e, sobretudo, proporciona a construção de redes e novos contatos com os agentes do sistema da arte. Com efeito, o programa de atividades para profissionais da ARCO – com uma manifesta ligação aos museus – e a escolha de muitos artistas que se constituem como valores seguros, pelas galerias, apontam para uma estratégia de articular o comércio da arte contemporânea com as instituições culturais (Moulin, 2003, 47), criando confiança nos colecionadores.
Programação e participantes do Foro e dos Encontros na página institucional da feira: http://www.ifema.es/ferias/arco/default.html.
Raymonde Moulin, Le marché de l’art. Mondialisation et nouvelles technologies, Paris, Éditions Flammarion, 2003 (1.ª Ed. 2001).